Um rapaz no trabalho hoje veio todo maravilhado ao descobrir que eu pratico as artes dos antigos samurais. Veio com um LOTE de idéias distorcidas sobre o que é ser samurai e o que isso efetivamente significa. Me falou aquilo tudo que leu na internet, principalmente nuns sites de uma péssima escola brasileira, que se diz difundir a “ARTE DOS SAMURAIS” no Brasil. Infelizmente, tive que quebrar a ilusão dele deste modo.
Pra começar, eu não sou, nem serei samurai. Não sirvo a uma família e sequer vivo há 260 anos, o que tecnicamente me impede de ser um SAMURAI. O Bushido (Caminho do Guerreiro) é LINDO na teoria, mas na prática, a história é muito diferente. Em primeiro lugar, o bushido nunca existiu como um código escrito, ou um conjunto de regras, porém era algo de ‘senso comum’ entre os guerreiros. Ademais, a maioria dos samurais sequer seguia tais códigos na prática, pois até para muitos deles isso parecia estóico demais. O seppuku (ritual de suicídio) era muito mais uma saída burocrática, ou seja, os que o cometiam conseguiam manter o nome e alguns privilégios para a família e era designado a alta classe. O restante, se quisesse, cometia mesmo o harakiri (corte na barriga, em tradução direta).
Muitos samurais curtiam um garotinho novinho, pois acreditavam que as mulheres lhes tirava a energia e o sexo entre kohai/senpai (sênior e júnior) fortalecia o elo entre os dois e o caráter, além do tetsu no kokoro (espírito de aço). Essa pederastia sodomita tinha até nome, Wakashudo, ou o caminho da juventude. Ao crescerem, o sexo acabava, pois parecia muito inapropriado, pois com meninos novos não era considerado homossexualidade e com mais velhos sim.
Passado o sengoku jidai (Período dos estados em guerra 1467-1615), a enorme maioria dos samurais se tornou desempregada e cresceu enormemente o número de ronins (samurais sem mestre, errantes ou vagabundos). Alguns inclusive foram responsáveis pelo nascimento de organizações criminosas, hoje conhecidas como Yakuza.
E mais, a lealdade era algo mais conectado a Daimyos (senhores de feudo) generosos e recompensadores e ao contrário do chushingura (a lenda dos 47 ronin), a enorme maioria não se matava se o seu daimyo fosse derrotado, mas sim integraria o exército oponente ou simplesmente, tinha sua cabeça cortada.
O período de paz de Tokugawa relegou a enorme maioria dos samurais a serviços burocráticos e uma pequena minoria ainda era hábil nas artes marciais, como a família Yagyu, Araki e Yamamoto. O restante, como brilhantemente mostrado no filme “o samurai do entardecer”, andava com a espada para não ser enquadrado judicialmente por não portá-la.
O maior momento do Bushido foi provavelmente durante o sengoku jidai e após isso, se tornou um ativo relativamente raro. Samurai foi uma classe maravilhosa, porém a visão realista da coisa dá para entender por que tão poucos seguem o caminho, por que tão poucos seguiram e melhor, por que tão poucos o seguirão e o entenderão. Enfim, samurai não era nenhum superman, era totalmente falível e passível de erros como todos os seres humanos, às vezes pior do que eu e vocês.